quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Nasce o Animacine

por André Dib

Nunca houve um festival de animação no interior de Pernambuco. Coube a Lula Gonzaga, autor do primeiro curta de animação feito no estado (“Vendo Ouvindo”, 1972) e do primeiro encontro brasileiro de animação (1987), realizar o Animacine – Festival de Cinema de Animação do Agreste, que desde a última terça-feira vem se revezando em filmes e ideias, exposições e oficinas.

Sediado em Caruaru, o Animacine tem alcance regional, se estendendo em mostras itinerantes em Gravatá e Bezerros. No emblemático Museu do Barro, a cerimônia de abertura foi marcada pela presença de importantes representações do cinema e da cultura popular, dimensão na qual o evento se propõe a trabalhar. Para Gonzaga, o cinema de animação é atividade estratégica para o fortalecimento da arte popular, no agreste representada pela música, xilogravura, a manufatura de bonecos e objetos de barro.

Conversa Animada com Sávio Marquês

Responsável pelo Movimento Canavial, na Zona da Mata Norte, o produtor cultural Afonso Oliveira falou sobre a importância de um evento como o Animacine. “Temos uma política cultural tímida para formação e patrimônio”, disse, elogiando a iniciativa como estratégica para a formação de uma política cultural capaz de formar novos produtores, ao contrário da cultura dos grandes eventos, baseados em palcos grandiosos e passageiros. “Sou a favor de pequenas subversões, contrárias aos grandes eventos, que só oferecem mais do mesmo”.

Antônio Carrilho: a produção de imagens precisa ser compreendida
O cineasta Antônio Carrilho trouxe a discussão para o campo do cinema e da necessidade de cada região ter sua própria representação audiovisual. “Precisamos perceber a importância do audiovisual nas nossas vidas. As imagens estão no nosso dia a dia e entender como elas são produzidas é essencial para reagir ao mundo de forma mais crítica. Assim poderemos desmistificar a produção da imagem e seu poder de manipulação”.

Logo após houve uma apresentação da Sambada do Coco de Umbigada do Guadalupe, que veio de Olinda para prestigiar o Animacine. Na sala ao lado, uma exposição de xilogravuras do Mestre Dila recebe os visitantes. Nascido em Caruaru, desde o ano 2000 Mestre Dila foi contemplado com o prêmio Patrimônio Vivo do Estado de Pernambuco.

Oficina Cinema de Animação ministrada por Lula Gonzaga
Formação - Do Rio de Janeiro compareceram Alexandre Jardim e Joaquim Eufrasino, técnicos enviados pelo Centro Técnico Audiovisual (CTAv) para realizar uma oficina de produção sonora para filmes de animação. A animação está no DNA do CTAv, que foi fundado em 1985 a partir de uma parceria entre a Embrafilme e o National Film Board (NFB), do Canadá, com o objetivo de auxiliar na formação de animadores em técnicas de baixo custo e com isso fomentar a produção de animação no país.

Além de trabalhar como mixador e com efeitos e ruídos sincronizados, Alexandre é responsável pela restauração do som dos filmes “Assalto ao Trem Pagador” e “A Rainha Diaba”. E Eufrasino, mais conhecido como Babá, atua desde os anos 1970, tendo fotografado boa parte dos curtas de animação brasileiros. Dois veteranos do cinema nacional, que compartilharam sua vasta experiência e contaram boas histórias.
Lula Gonzaga ao lado do troféu criado por Ed Bernardo
A parceria com o CTAv também rendeu uma mostra de nove curtas realizados no núcleo de animação de lá. Além disso, o melhor curta da Mostra Competitiva Nacional terá como prêmio o empréstimo de uma câmera 35mm e uma câmera Digital SI-2K pelo período de duas semanas. Já o vencedor da Mostra Formação será premiado com um serviço de mixagem de som. Além disso, os vencedores de cada categoria ganham troféu confeccionado pelo artesão Ed Bernardo. 
Alunas da oficina de recorte digital com Marcos Buccine aprendem a movimentar personagens
Outro parceiro do festival é o designer e professor da UFPE Marcos Buccini, que ministra oficina de recorte digital. “Para participar não é preciso saber desenhar, pois nos concentramos em termos de tempo e movimento”. Buccini também coordena o Maquinário - Laboratório de Animação da UFPE, do qual fazem parte 35 alunos de design. Apesar do que o uso da tecnologia – computadores Mac e software After Effects – pode insinuar, trata-se de um trabalho 100% artesanal, feito com a mão no mouse e dedos no teclado.

Ao dar seus primeiros passos, o Animacine assume um papel pioneiro de catalizador de uma produção que valoriza as raízes para gerar novos frutos, principalmente por se inserir em um contexto jovem e vibrante de produção audiovisual, aliado à tradição do interior nordestino. Lula Gonzaga admite que o festival precisa melhorar, já que esta primeira edição foi feita com recursos reduzidos. Um crescimento necessário, que não deve colocar em risco a dimensão humana, uma das forças do evento. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário